Coluna: Opinião jurídica
Colunista: Lúcio Roca Bragança
Neste último 03/06/2025, Porto Alegre sediou um dos mais importantes eventos de discussão da nova Lei de Seguros a entrar em vigor em dezembro próximo (Lei 15.040/2024). Realizado no Tribunal de Justiça do Estado, com a presença de desembargadores e juristas de renome nacional, inclusive o principal autor do anteprojeto, foi uma oportunidade de aprofundar o debate com aqueles que terão a última palavra no Estado sobre a aplicação da Lei – os nossos julgadores.
Tive oportunidade de participar de uma mesa com o Presidente do Sincor/RS, André Thozeski, a Diretora Jurídica da CNSEG, Glauce Carvalhal, e a Diretora da SUSEP, Jéssica Bastos. O tema que eu lancei para o debate, o fiz, começando com uma pergunta: Quem deve escrever as cláusulas de seguro, o Estado ou a Seguradora? Durante muito tempo, a redação do clausulado, no Brasil, ficou adstrita à SUSEP através condições padronizadas e obrigatórias. A partir da Lei de Liberdade Econômica de 2019, iniciou-se um movimento de maior flexibilidade no conteúdo dos contratos, com a edição das normas administrativas correspondentes. Como fica este cenário a partir da nova Lei? Haverá mudanças naquilo que diz respeito à inovação de cláusulas e produtos?
A Diretora Jurídica da CNSEG respondeu ao questionamento, dividindo a sua análise entre os seguros massificados e o de grandes riscos. Quanto ao primeiro, ponderou acerca de sua natureza homogênea e dinâmica, que exige uma rapidez de oferta e contratação, a dificulta uma maior variação nos produtos. Ainda assim, as seguradoras esforçam-se por trazer sempre os produtos mais adequados possíveis aos consumidores, a fim de atender seus interesses e também, evidentemente, incrementar as vendas. Mas, de toda forma, por sua natureza, é um contrato redigido pela seguradora.
Já no que tange aos grandes riscos, seu posicionamento foi no sentido de que deve ser um contrato negociado entre ambas as partes. Em diversos grandes seguros realizados no Brasil, houve a discussão cláusula a cláusula. Em sendo um contrato discutido por duas partes que são hipersuficientes, não havendo vulnerabilidade por nenhum dos contraentes, há de se considerar como sendo um contrato escrito não apenas pela seguradora, mas também pelo segurado.
A Diretora da SUSEP expôs que a Autarquia vinha fazendo um movimento de flexibilizar a redação do clausulado de seguros no Brasil, mas resguardando um núcleo mínimo de conteúdo obrigatório voltado à proteção do segurado. A seguradora tem a liberdade de escrever a redação como preferir, mas não pode deixar de fazer constar as cláusulas referenciais impostas pela SUSEP como de presença obrigatória.
A interpretação que ela faz da Lei 15.040/2024 é no sentido de que a nova legislação preserva este modelo já adotado pelo órgão regulador. Não há, na nova lei, comando para um retorno ao clausulado padrão que existia; ao revés, há uma determinação de proteção através de um conteúdo mínimo, mas preservando a liberdade de redação contratual. Por conseguinte, a partir da vigência da Lei, não haverá, por parte da SUSEP, uma política de determinar às seguradoras como elas devem escrever seus contratos, havendo, neste tocante, uma continuidade da atual situação, vigente desde a Lei de Liberdade Econômica.
Diante deste posicionamento da SUSEP e das seguradoras, a perspectiva é de que o Brasil avance na inovação de produto e clausulados, que ainda é tímida perto do que poderia ser, talvez ainda como resquício de um tempo em que a única concorrência possível ocorria em termos de preço. Mas o que País precisa é de uma maior criatividade e inovação em relação às apólices, para abandonarmos de vez a uniformidade de clausulados, a redação infinita e modorrenta, as garantias lacunosas ou inadequadas, até chegarmos a um nível já alcançado em outros países, como Portugal, onde se considera existir um dever de adequação do produto de seguro ao cliente.
Advogado no Escritório Boch&Favero. Pós-graduado em Direito do Seguro e Direito do Estado.
Diretor Jurídico Adjunto do CVG/RS. Secretário-Geral da Comissão de Seguros e Previdência Complementar da OAB/RS.



